Independente, desde miúda que um dos sonhos de Joana era ser independente.
Ao longo dos seus trinta e um anos de vida ela conseguiu praticamente tudo aquilo que queria: um emprego bem remunerado, casa e automóvel próprios e acima de tudo a sonhada independência.
Nos últimos tempos os sonhos de Joana mudaram, a palavra “independente” começou, a cada dia que passa, a transformar-se em “solidão”.
Joana deu sempre prioridade à sua carreira profissional, os raros casos amorosos que teve no passado foram constantemente relegados para segundo lugar, como tal, acabavam por durar pouco tempo.
Apesar de Joana não se arrepender de nada, também não consegue esconder que lhe falta qualquer coisa na vida, algo que a preencha totalmente enquanto mulher, isso torna-se ainda mais evidente quando ela constata que grande parte das suas amigas de infância estão casadas e com filhos.
Actualmente na vida de Joana os suspiros começam a ser mais do que as gargalhadas.
Inicio:
Joana despede-se carinhosamente de Rafael, um periquito em tons de azul que lhe foi oferecido pela mãe, e sai de casa.
Enquanto conduz, Joana toma consciência que aquelas idas ao Centro Comercial todos os sábados para almoçar com a sua amiga Helena, têm sido as únicas ocasiões em que ela sai de casa sem ser para ir trabalhar.
Subitamente um feixe de luz, provocado pelo sol de Inverno, reflecte-se nos óculos de Joana afastando-a abruptamente daquele pensamento… um suspiro é a última coisa que se ouve antes de Joana ligar o auto-rádio.
Quando Joana chega ao parque de estacionamento do Centro Comercial, apercebe-se que este está a tipicamente cheio para um fim de manhã de sábado.
Um indiscreto cartaz publicitário, colocado à entrada do Centro Comercial, anuncia aos seus visitantes que vai ali decorrer durante o fim-de-semana, uma mostra das denominadas “ciências ocultas”.
Os largos corredores do Centro normalmente despidos de movimento àquela hora, estão cheios de curiosos que não hesitam em entrar para dentro de uns pequenos compartimentos onde as mais estranhas pessoas tentam mostrar a sua “ciência”.
Joana parece perdida no meio de todo aquele movimento e barulho inesperados, enquanto ela caminha, tentando desviar-se das pessoas, uma coisa chama a sua atenção: um cartaz, colocado por cima de um dos pequenos stands, onde está escrito: “SE FALHOU É PORQUE TENTOU – Se de sofrer está farta, ouça a Madame Maxine que a avisa, a minha consulta é barata, aceito dinheiro, cheque e VISA”.
Meio intrigada, meio a sorrir, Joana continuou a andar mas com os olhos postos no cartaz que ficou para trás, de repente ela choca com uma pessoa que vinha na direcção oposta.
Os óculos de Joana caiem, a pessoa em quem ela embateu apresta-se a apanhá-los do chão e entrega-os à ainda atordoada Joana.
Embaraçada com a situação, Joana coloca os óculos e vê que à sua frente está um homem com cerca de trinta anos que lhe sorri timidamente. Durante breves instantes ficam simplesmente a olhar um para o outro.
Ainda mesmo antes que qualquer um deles tivesse tempo de dizer fosse o que fosse, ouve-se a voz de alguém a chamar por Joana.
É Helena, a amiga de Joana, que se aproxima enquanto faz sinais à amiga, Joana retribui-lhe os sinais esquecendo por momentos o misterioso homem que está ao seu lado.
A chegada de Helena é, como sempre, espalhafatosa, as mãos carregadas de sacas de compras ajudam ao pequeno caos que se instala naquele pequeno espaço.
Depois dos calorosos cumprimentos entre as duas amigas, Joana volta-se para o sitio onde estava o desconhecido homem, este desapareceu tão inesperadamente como havia aparecido.
Joana ficou na dúvida se aquele encontro tinha sido por conta de uma ilusão, uma tolice da imaginação, ou se tinha acontecido realmente.
Temendo que uma vez mais Helena a acusasse de sonhar acordada, Joana resolveu não contar à amiga o que lhe tinha acontecido.
As duas foram almoçar, durante o mesmo fizeram a habitual brincadeira entre elas: atribuir uma pontuação de 0 a 10 a todos os homens que passavam por elas.
Depois do almoço, quando as duas iam a caminho da saída do Centro Comercial, Joana não conseguiu evitar de olhar para o mesmo cartaz que a havia deixado intrigada, Helena percebeu a curiosidade da amiga e desafiou-a a entrar na cabine da Madame Maxine.
Renitente mas ao mesmo tempo decidida, Joana aceitou o desafio de Helena e as duas entraram no misterioso mundo do “oculto”.
Logo à entrada da cabine os visitantes são convidados a tirar o calçado, o chão parece ser feito de veludo dando a sensação de se caminhar em cima de uma nuvem.
Um irreconhecível mas agradável odor paira sobre o ar, assim como uma espécie de neblina de cor violeta.
Ao fundo, sentada numa mesa redonda está a Madame Maxine, uma mulher que sentada parece ser maior que as duas amigas juntas.
No centro da mesa está uma bola de cristal que emite raios de luz na direcção do rosto da Madame Maxine tornando difícil ver os seus traços.
Joana e Helena são convidadas a sentarem-se, Joana tenta esboçar uma fuga mas a amiga segura-a firmemente pelo braço e diz-lhe que agora têm de ir até ao fim.
As duas amigas sentam-se.
Helena estendeu a mão para que Madame Maxine lhe lesse a sina, no entanto enquanto fazia isso, Madame Maxine não tirava os olhos de cima de Joana, deixando-a extremamente desconfortável.
Segundo as visões e previsões de Madame Maxine, Helena iria em breve ter o dinheiro suficiente para comprar a casa que queria, Helena ficou extasiada com a novidade.
“Pronto, já podemos ir agora?” – perguntou nervosamente Joana farta de estar a ser vitima do indiscreto olhar de Madame Maxine.
“A menina não quer saber o que o futuro lhe reserva? Consigo ver nos seus olhos que anda à procura de alguma coisa.” – disse de forma segura Madame Maxine.
“Não… eu… eu, não acredito nestas coisas.” – respondeu-lhe Joana.
“Talvez acredite nisto!” – ripostou Madame Maxine, fazendo aparecer, vinda não se sabe de onde, uma pequena caixa que segura nas mãos.
“Uau, fantástico! Até temos direito a magia e tudo.” – disse Helena a brincar.
Joana levantou-se rapidamente e saiu da cabine.
“Menina, dê isto à sua amiga.” – disse Madame Maxine para Helena enquanto abre a pequena caixa, lá dentro está um anel com uma pequena pedra de cor verde incrustada.
“Este anel vai indicar à sua amiga aquilo que ela anda à procura” – continuou Madame Maxine.
“Vai indicar, como, isso fala?”
“Olhe, faça só o favor de o entregar à sua amiga, ok? E não se preocupe em pagar nada… agora vá.”
Helena saiu da cabine e foi ter com Joana.
“Então Joana, o que se passa?” – perguntou Helena.
“O que é que tu queres?” – respondeu Joana, enquanto as duas amigas se encaminham para o parque de estacionamento do Centro Comercial.
“Já sabes como aquelas coisas me deixam nervosa.” – concluiu Joana.
“Mas a senhora foi tão simpática.” – retorquiu Helena, Joana lança-lhe um olhar pouco amistoso.
“A sério, ela até me pediu para te entregar uma coisa.” – continuou Helena, tirando do bolso a caixa que Madame Maxine lhe havia entregado.
Já fora do Centro Comercial, as duas amigas páram de caminhar, Helena entrega a pequena caixa a Joana.
“O que é isto?” – perguntou Joana intrigada.
“Abre... foi uma oferta da Madame Maxine para ti.”
Joana abre desconfiadamente a caixa e vê o anel.
“O que significa isto... é um pedido de casamento?” – perguntou Joana.
“Acho que não” – sorriu Helena.
“Não percebi muito bem a coisa mas parece que esse pequeno anel te vai indicar aquilo que andas à procura.” – continuou a explicar Helena.
“Certo... mais alguma piada?” – disse Joana enquanto fecha displicentemente a caixa.
As duas amigas recomeçam a caminhar em direcção do parque.
“Joana, a sério, ouve... porque é que não experimentas? Não tens nada a perder com isso, quem sabe se o anel te vai mesmo ajudar?”
“Pois... deixa-me ver... se as contas não me falham, as probabilidades de acontecer algo do género são de uma em dez milhões.”
Apesar das tentativas de Helena, Joana parece não levar muito a sério a história do anel. As duas amigas despedem-se uma da outra e cada uma vai para sua casa.
Segunda-feira, Joana, devido ao facto de trabalhar no outro lado da cidade, acorda muito cedo.
Como habitualmente ela, enquanto se prepara para sair de casa, vai falando com Baltazar, o periquito, não que ela espere qualquer tipo de resposta vinda da parte dele, mas porque chegou à conclusão que aqueles “desabafos” a têm ajudado a suportar melhor os dias.
“Pronto, acho que está tudo.” – diz Joana enquanto olha, uma última vez, para dentro da sua carteira para ter a certeza de que não se esqueceu de nada.
Dentro da carteira, Joana vê a caixa que a Madame Maxine lhe ofereceu, pega nela e abre-a, Joana fica a olhar para o anel.
“Tinha-me esquecido disto... que dizes, Baltazar... levo o anel?”
Depois de alguns instantes, Joana toma uma decisão.
“Bem, acho que não me vai acontecer nada de mal se o levar... até logo, Baltazar.”
Joana coloca o anel e sai de casa.
Apesar de ser Inverno e de estar bastante frio, a luz do Sol começa a fazer-se notar, Joana desce a rua e encaminha-se para a paragem de autocarro mais próxima.
O autocarro que a vai levar até à estação do metro chega, Joana entra para dentro dele.
Talvez influenciada pelo facto de estar constantemente a olhar para o anel, Joana pensa ver na rua o desconhecido com quem embateu no Centro Comercial.
“Devo estar a delirar.” – pensou ela, metendo as mãos dentro dos bolsos do casaco.
Chegada à estação do metro, Joana, uma vez mais, pensa que vê ao longe o mesmo individuo. Alguém ao passar por ela dá-lhe um pequeno encontrão, Joana perde o rasto da pessoa que pensou ver.
Já atrasada, ela entra para dentro do metro, deita a cabeça por fora da janela na esperança de ver o misterioso homem uma última vez... não o consegue encontrar, conformada vira-se para se sentar, nesse instante choca com alguém, os seus óculos caem.
Alguém apanha os óculos do chão e entrega-os a Joana, essa pessoa é precisamente a mesma com quem ela havia chocado no Centro Comercial.
“Obrigado... uma vez mais, nem lhe cheguei a agradecer pela outra vez.” – disse a tremer de emoção Joana.
“Não faz mal, já fico contente por se ter lembrado de mim.” – respondeu o desconhecido a sorrir.
Os dois sentam-se, precisamente um em frente do outro, o metro começa a andar lentamente.
“E agora... o que é que eu digo ou faço... será que ele é comprometido... acho que é... não posso começar a sonhar agora...” – pensava Joana, não sabendo o que fazer para esconder o nervosismo.
Joana olha para o anel e começa a mexer-lhe, subitamente, entra pela janela da carruagem um raio de luz do Sol que bate na pedra do anel fazendo com que a sua luz se vá projectar nos olhos do desconhecido, este para se proteger mete uma mão à frente dos olhos, curiosamente também ele tem um anel, um precisamente igual ao de Joana, um feixe de luz sai desse mesmo anel e vai embater suavemente no rosto de Joana.
FIM
Esta história é dedicada à pessoa que me deu a inspiração para a escrever... (penso que ela sabe quem é).
Sem comentários:
Enviar um comentário